quarta-feira, 23 de março de 2011

GERARD VAN LOON E AS PRIMEIRAS MOEDAS CUNHADAS NO BRASIL

                                                                                        © 2011 Marcio Rovere Sandoval


Fig. 1. Ilustração do livro de Gerard Van Loon, Histoire Mettalique dês XVII Provinces des Pays Bas..., edição em francês de 1732, pg. 283, contendo as moedas cunhadas pela Companhia das Índias Ocidentais, em flamengo GWC – Geoctroyeerde Westindische Compagnie ou ainda WIC – “West-Indische Compagnie”. Os valores cunhados em ouro foram: XII, VI e III florins ou ducados, nos anos de 1645 e 1646.

Realizamos a tradução dos comentários de Van Loon a respeito destas moedas a partir do exemplar em francês (francês arcaico). Nesta primeira parte, concernente ao ano de 1646, ele menciona as moedas de ouro cunhadas pela Companhia holandesa, mais conhecida nos meios acadêmicos pela sigla WIC. Posteriormente faremos a tradução da parte que trata da moeda cunhada em 1654 (XII soldos ou stuivers). Estas foram as primeiras moedas cunhadas no Brasil.
"Esta vantagem era bem pouco considerável, em comparação à perda que a Companhia sofreu no Brasil, tanto durante o ano precedente, que durante este, pela pérfida e pela traição dos portugueses, que tomaram de um só golpe quase tudo o que a Companhia tinha adquirido pouco a pouco, tanto pelo sangue que pelas despesas. Em 12 de junho do ano de 1641 fora concluído com o novo Rei de Portugal, após que este Reino ficou livre do julgo dos espanhóis, uma trégua de dez anos, pela qual fora estipulado que se conservaria tanto de um lado quanto do outro tudo o que estivesse em sua possessão. Os portugueses, no entanto, inquietos da negociação de paz, temiam que as Províncias Unidas, livres da guerra com a Espanha, não caíssem sobre eles na América com todas as suas forças após o fim da trégua. Para prevenir esta situação, eles faziam todos os esforços no Brasil para acalmar os holandeses, em elogiando a suavidade do Governo Holandês para de outro lado, eles tentavam na surdina ganhar a confiança de seus compatriotas que estavam sob o julgo da Companhia e de lhes inspirar um espírito de revolta. Seu objetivo era de provocar contra a Companhia uma revolta geral, de massacrar todos os primeiros oficiais durante uma festa de casamento e de se tornar senhores do Recife, de Serinhaem, de Nazaré e de outros lugares importantes. Mas os holandeses que haviam sido advertidos por uma carta enviada de sua pátria que se tramava contra eles uma funesto projeto, evitaram o golpe, prenderam vários navios carregados de armas e forçaram os inimigos, que tendo pegado em armas, já tinham formado um batalhão, a fugir para o mato. Como esta conspiração não deu resultado, os portugueses se armaram abertamente, pilharam os campos, queimaram as plantações dos holandeses, massacraram os seus operários e suas gentes do mar, e ameaçaram com a forca todos os que se recusassem as reconhecer o Rei de Portugal como soberano. Os súditos da companhia muito fracos para parar pela força uma revolta tão universal, fizeram publicar uma anistia geral e entregaram alguns deles para o Vice-Rei português. Mais esta atitude estava tão longe de fazer um bom efeito que um dos empregados foi tão perverso a ponto de vender aos inimigos o Cabo de Santo Agostinho, do qual ele era o comandante. O General Huys viu entre outros acontecimentos seus soldados serem derrotados perto de Cameron e uma frota de quarenta grandes navios aportar um grande socorro aos portugueses revoltados que, tomaram por um assédio a fortaleza de Serinhaem, desfizeram inteiramente as tropas holandesas, isoladas do contato com Recife e tomaram espada em mão Porto Calvo e Rio de São Francisco. Eles teriam se tornado senhores do Recife mesmo si, se por chance uma frota holandesa carregada de víveres, não tivesse vindo acostar no porto. A guerra que começara assim nestes recantos se prolongou por dez anos, durante os quais os nativos do país e mesmos os ventos tomam partido dos portuguêses, de uma maneira tão perniciosa para a Companhia, que ela foi forçada a abandonar inteiramente o Brasil, porque lá ela fora quase totalmente arruinada. No entanto, antes de chegar a este extremo ela se defendeu em todos os lugares com muito valor e por ainda estar em condições de pagar suas tropas ela decidiu, pela falta de moeda, cunhar as seguintes peças:"


Fig. 2 – A mesma ilustração da Fig.1, esta da edição holandesa de 1726. Veja a marca da placa de impressão no papel.

"A primeira é de doze francos, a segunda é de seis e a terceira de três. Abaixo das cifras romanas que exprimem seu valor, pode-se ver a legenda holandesa:
Geoctroyeerde Westindische Compagnie
Companhia Privilegiada das Índias Ocidentais
Trata-se da outorga dada a esta Companhia em 3 de junho de 1621, e por causa das perdas que ela sofrera, ela fora assistida pelos Estados da soma de setecentos mil francos. No reverso de cada uma das três moedas pode-se ver esta inscrição:
BRASILIÆ ANNO 1646.
No Brasil. Ano de 1646."

(in, Histoire Mettalique des XVII Provinces des Pays-Bas, depuis l'abdication de Charles-Quint, jusqu'à la Paix de Bade en MDCCXVI. Gerard Van Loon. La Haye: P. Gosse, J. Neaulme et P. de Hondt, 1732, p.283-284.

Autor: Marcio R. Sandoval (sterlingnumismatic@hotmail.com)